Cariocas parte II.
Diferente
da primeira parte desta história que falava de uma amizade feita no Nordeste
brasileiro, agora vou falar de outra amizade só que conquistada em outra região
do Brasil, mas especificamente na região centro-oeste, no Pantanal
mato-grossense. Como de costume e quando sobra uma graninha nas férias, eu e a
família saímos para dar um giro e descansar um pouco da nossa turbulenta
cidade, já passamos por Poços de caldas, Caldas novas, Bertioga e Pantanal. E
detalhe, sempre no SESC que além de atender muito bem em relação a
entretenimento também atende muito bem em hospedagem. Vale
muito a pena conhecer.
Essas
viagens são sempre muito prazerosas, pois além de estar com a família
desfrutando de novas paisagens, costumes e culinárias diferentes, sempre
conhecemos pessoas interessantes que carregamos ao longo de nossas vidas, mesmo
que seja pelo menos na lembrança, se bem que hoje em dia com o advento da
internet é muito fácil manter contato.
Nesta
última viagem que fizemos para o Pantanal logo chegando ao aeroporto de Cuiabá,
conhecemos uma galera na van que fazia nosso translado para o hotel, entramos
no veiculo e pegamos a estrada sentido a cidade de Poconé, lugar esse onde fica
o hotel. Viagem rápida de aproximadamente 2hs e nesse percurso como ainda não
conhecíamos ninguém fomos calados só observando a paisagem e fazendo aqueles
comentários de praxe de quando chegamos a algum lugar novo, falando do clima, o
transito, o tamanho da cidade, enfim, coisas desse gênero que foge da nossa
rotina cotidiana.
Durante
esse percurso já estabelecemos um primeiro contato com esses novos amigos, eu e
meus acompanhantes estávamos sentados no fundo da van e por isso não
alcançávamos a água, e como é de se imaginar estava um baita calor, era uma
três horas da tarde, imagine o sol, estava muito quente, na estrada dava até
para ver a fumaça subindo do asfalto, tamanha a temperatura daquele lugar,
enfim, sofríamos com aquela temperatura e o carioca sempre solicito oferecendo
água para toda a galera, que gentileza desse cara, nunca tinha nos visto e
aquela presteza toda, achei muito simpático por parte dele.
Então,
esse sujeito assim como eu estava acompanhado da família, só que ele estava com
a esposa e filha e eu além da esposa e filho também tinha o sogro de companhia,
aquela coisa de férias familiar, começa tudo bem e no final aquela azia toda,
um querendo fuzilar o outro, assim como naqueles filmes Italianos, começa a
festa esta tudo bem, no meio aquela briga fenomenal e no fim todos bêbados
chorando e se abraçando, a maior novela.
Voltando
a nova amizade, os referidos eram cariocas como já foi dito, e ao contrario do
que muitos pensam sobre eles acho eu que é puro engano e preconceito, nós
Paulistanos assim como alguns cariocas carregam aquele estereótipo bairrista,
pura bobagem e despeito de nós paulistanos, pois não temos aquelas paisagens
que eles desfrutam todos os dias, se bem que temos muitas aqui em são Paulo também. Essa galera do Rio de Janeiro é sempre muito
simpática e solicita, sem falar no humor, que sempre estão num bom astral,
gosto muito desse jeito que eles tocam a vida, muito espirituoso e divertido, e
o sotaque nem se fala, é o maior barato, enfim, um pessoal divertido que só quer
aproveitar a vida.
Fizemos
esse longo e caloroso trajeto e finalmente chegamos ao local desejado, um
simpático hotel no meio do mato, mas com uma acomodação espetacular, tinha de
tudo que uma família de férias precisa. Tranquilidade, boa acomodação e alguns
dias longe do tumulto louco da Cidade de São Paulo, e era isso que estávamos
precisando.
Chegamos
nos acomodamos e fomos desfrutar do nosso tão desejado descanso e ai que tudo
começou, nos trocamos e fomos para a piscina ficar jacaresando e tomando umas
cervejas, só que naquele momento já entrando no espírito da viagem e perdendo a
timidez, começaram ai as conversas, fomos conhecendo uns aos outros assim como
numa festa, primeiro chegamos com uma certa timidez e depois de umas cervejas
já conhecemos meio mundo como se fossemos melhores amigos de infância, é sempre
assim quando tem uma pingaiada, se bem que nem todo mundo bebe ou é facinho
como eu sou, viagem é isso, novas amizades e descontração, se não for assim não
vale a pena.
Bom,
viajamos descansamos e acima de tudo fizemos uma boa amizade, nos encontrávamos
a beira da piscina, no café, no almoço e jantar, como tudo era feito no próprio
hotel era inevitável que nos encontrássemos, as mesmas pessoas durante as
refeições e divertimento, assim como numa viagem familiar, todos juntos ao
mesmo tempo e aquela bagunça toda, muito divertido sem falar nos outros grupos
que também estavam hospedadas por lá, uma grande festa.
Como
era inevitável, acabamos nos aproximando e conversando sobre tudo um pouco e eu
como um bom proseador sempre cheio de conversas e mentiras, acho o maior barato
exagerar nos meus comentários, sempre arrumo uma história para valorizar o
assunto, só que desta vez acabei arrumando um adversário à altura, falávamos as
mais absurdas bobagens um querendo se valorizar mais que o outro e assim por
diante, maior barato e o melhor da história que um sabia do outro, falávamos
muitas balelas como se fossem a mais pura verdade, da minha parte tinha
algumas, claro que com uma pitada de exagero para não perder o costume, e assim
fomos tocando, uma bobagem atrás da outra até o término da viagem.
Lembro
que em uma de nossas conversas, eu estava falando de uma viagem que eu tinha
feito para o Norte do Brasil, teve uma época que trabalhava fazendo pesquisas,
e num desses trabalhos acabei passando pelo estado de Roraima, na cidade de Rio
Branco, longe pra caramba, demorei horas de vôo para chegar, sem falar nas
escalas que tive de fazer, primeiro Brasília, depois Manaus e por fim Rio
Branco, Roraima, demorei umas oito horas para chegar, enfim, essa informação é
irrelevante perto do episodio que passei por lá, era disso que eu estava
falando para o carioca e ele na maior atenção até que eu falei de um sujeito
que eu havia conhecido, pensei que fosse abafar contando a história e o carioca
lá, nem Tchan para minha história, belo sacana esse cara, contei tudo com a
maior empolgação e ele achando tudo muito normal, fiquei ferrado com o
comportamento dele perante meu causo, enfim, qual era a história?
Nessa
viagem que fiz a trabalho passei quatro dias na cidade de Rio Branco, e como
meu trampo era itinerante fixava base numa cidade e fazia o trabalho, por isso
ficava hospedado em um único hotel para facilitar minha logística e como sou
muito curioso e tinha tempo ocioso boa parte do dia, ficava curiando as coisas
do hotel, não tinha muita coisa a fazer mesmo, fazia meu trabalho na parte da
manhã e passava o resto do dia perambulando na cidade ou ficava no hotel mesmo,
sozinho era o que dava para fazer, ainda mais naquela cidade, tudo bem era o
que tinha para o momento.
Como eu tomava café, almoçava e jantava no
hotel fui vendo algumas coisas curiosas que aconteciam por lá. E olha que
diferente, no restaurante do hotel tinha um garçom que trabalhava os três
períodos, passava o dia inteiro no hotel, quando não era hora das refeições
estava fazendo outros serviços que demandavam, era uma espécie de faz tudo,
muito eficiente o rapaz, fazia de tudo um pouco e sempre era prestativo com as
minhas solicitações mesmo com todas as dificuldades na comunicação, pois o
mesmo era surdo mudo e ai a comunicação de fato ficava muito difícil, era uma
dureza falar e entender, mas eu me esforçava assim como ele, acabou ficando
muito divertido a comunicação.
Passei
os três primeiros dias me comunicando do jeito que dava e achava tudo aquilo
muito engraçado, via o garçom tentando falar com todo mundo no hotel, ele
passava de mesa em mesa e todo mundo tirando a maior onda junto com ele, como o
hotel era quase uma residência pra muitos dos seus hospedes, muitos dos que ali
estavam hospedados já eram quase amigos, tinha um time de futebol que morava
lá, um Juiz e uma advogada de Manaus, era como se fosse uma grande pensão,
todos morando debaixo do mesmo teto só que nesse caso era um hotel e foi ai que
comecei a entender uma curiosidade.
Olha
que engraçado, observei aquele garçom durante esses dias, surdo mudo, índio e
um jeito meio afeminado, o rapaz era homossexual, ai fiquei pensando, só eu
mesmo para ver tamanha diversidade em uma única pessoa, que cara divertido, era
o maior barato, todos brincavam e respeitavam muito ele e assim foi achei
engraçada a situação, como já estava quase na hora de ir embora acabei me
aproximando dos outros hospedes o tal Juiz e a advogada, combinamos de ir
jantar juntos fora do hotel e tomar umas cervejas e ai vem a maior curiosidade,
quando estávamos conversando no restaurante os dois me confidenciara que o
rapaz além de surdo mudo, índio, homossexual ele também era fofoqueiro, fazia a
maior intriga entre os hospedes do hotel, achei isso o Maximo, como alguém
surdo mudo pode ser fofoqueiro, fiquei me questionando e vi sim que isso era
possível, ai entendi aquela farra toda que todos faziam quando ele passava
pelas mesas, todos entendiam menos eu que estava fora daquele contexto, nunca
vi nada tão louco e olha que tenho amigos bizarros, mas não nesse escalão,
quando conto ninguém acredita, mas é a mais pura verdade.
Pronto
contei para o carioca, na maior empolgação e o mesmo nem se abalou. Disse que
era possível sim ter um surdo mudo fofoqueiro, começou a imitar o rapaz mesmo
nunca tendo visto ele, e o pior da história
é que ficou igualzinho o rapaz quando
estava passando pelas mesas, parecia ate que ele havia presenciado a
cena, fiquei frustrado e ao mesmo tempo
dei muita risada. Como esse carioca é sacana e espirituoso, terminei minha
história e ai veio à vez dele.
Como
ele não queria ficar na desvantagem também veio com algumas histórias absurdas,
na verdade ele contou varias, ficamos horas a beira da piscina contando
absurdos um ao outro e família é claro concordando com tudo que estávamos
falando, como se fosse uma espécie de festival de mentiras cada um com a sua
torcida e ai ele começou.
Lá
vem a história, o carioca começou falando de quando ele era Office boy no Rio
de Janeiro, ele num determinado momento teve de ir levar uma correspondência
num prédio no centro do Rio, disse que era um daqueles prédios antigos que tem
aqueles elevadores com a porta sanfonada, aqueles bem sinistros sabe? Que dão
aquele tranco logo que começam a subir ou descer e que nos deixa de cabelo em
pé, esses elevadores realmente são tenebrosos, ainda hoje existem uns desses
aqui em São Paulo, são poucos mas ainda tem, enfim, foi contando essa passagem
e ai que vem o espantoso. Nesse elevador que ele estava descendo tinha um
senhor vestido de terno branco e chapéu Panamá, quando ele viu esse senhor ele
achava que o conhecia e perguntou o nome dele e para seu espanto o senhor
respondeu.
Soy
Carlos Gardel.
O carioca quase se borrou, desceram do
elevador e lógico que Carlos desceu primeiro e quando ele saiu do elevador o
tal músico misterioso já havia sumido, foi embora morrendo de medo e quando
chegou em casa contou para a avó, que
lhe dissera que Carlos Gardel já havia morrido a muito tempo e assim foi, nunca
soube desvendar essa história. E veio a minha vez, o chamei de mentiroso e
continuamos nossa prosa, um querendo contar uma história melhor que a outra, e
o carioca tentando me convencer “Meu Irmão sai correndo, quase morri de medo”
que história fantástica, morremos de rir e assim foi nossa prosa, cheia de
absurdos memoráveis e divertidas risadas assim como os bons amigos devem ser.
Viva a amizade, os Índios e Carlos Gardel.